Razão Filosófica e Razão Científica
Tem-se comumente a idéia que o filósofo é aquele que divaga em
questões abstratas, desconectadas da vida cotidiana com um discurso
que não diz respeito aos interesses da maioria. Ao cientista, pelo contrário,
atribui-se a imagem de um pesquisador confinado em seu laboratório
preocupado com problemas práticos, imbuído na elaboração
de um saber útil. No entanto, podemos questionar: até que ponto o saber
filosófico não é operacional, ou seja, não tem utilidade; e o quanto
o saber científico está próximo das expectativas práticas? Quais são
objetivamente as diferenças entre a filosofia e a ciência?
Com os gregos a filosofia comporta todos os saberes: matemática,
astronomia, geometria são exemplos de conhecimentos que surgiram
juntamente com o questionamento filosófico. Na Idade Média, a filosofia
torna-se um instrumento da teologia, isto é, uma vez que o conhecimento
estava restrito aos monastérios, ciência é conhecimento inspirado,
ou de origem divina. Na modernidade, filosofia e ciência seguem
caminhos diferentes determinados por uma metodologia própria. O
método determina a diferença de abordagem dos problemas em cada
área e a lógica é o instrumento comum entre a ciência e a filosofia.
A filosofia caracteriza-se pelo discurso racional, isto é, teórico-reflexivo,
seu método visa explicitar a relação entre particular e universal
com o intuito de conceituar e ampliar a compreensão do homem
no mundo.
Ciência e Senso Comum
De acordo com Vásquez (1968), o senso comum é um conhecimento
prático, utilitário, sem ou quase sem nenhuma teoria, integrante da
chamada cultura popular. O conhecimento oriundo do senso aparece
como uma força de resistência das camadas mais baixas, ou que não
tem acesso aos meios de tecnologia. Neste sentido podemos nos questionar,
fazendo uma análise do quanto o conhecimento científico alcança
seus objetivos, chegando aos maiores interessados que são as
pessoas comuns, os cidadãos. Será que a ciência e seus subprodutos
chegam a todos? Haveria algo no senso comum, em sua maneira de
perceber o mundo que seja correlato ao conhecimento científico?
Para Antonio Gramsci: “(...) não existe um único senso comum,
pois ele é um produto e um devir histórico”. O senso comum e também
a religião “(...) não podem constituir uma ordem intelectual porque
não podem reduzir-se à unidade e à coerência nem mesmo na
consciência individual”. O senso comum, ainda que implicitamente,
“emprega o princípio da causalidade”; “em uma série de juízos, identifica
a causa exata, simples e imediata, não se deixando desviar por
fantasmagorias e obscuridades metafísicas, pseudo-profundas, pseudocientíficas
etc.” Nisto reside o valor do que se costuma chamar bom
senso”. (GRAMSCI, 1991. p. 16.)
Com o nascimento da filosofia, os gregos foram aos poucos rompendo
com o mito e a religião. Da mesma maneira o pensamento científico
pretende romper com o senso comum. Assim, enquanto a primeira
ruptura é imprescindível para constituir a ciência, a segunda
deve transformar o senso comum em um conhecimento que chega a
todas as camadas, depurado de seus preconceitos e pré-juízos. Com
essa dupla transformação, o que se espera é um senso comum esclarecido
e uma ciência coerente com as realidades sociais; um saber prático
que dá sentido e orientação à existência e se apega à prudência
para encontrar o bem comum. Depois de romper com senso comum,
a ciência deve se transformar num novo e melhorado senso comum,
combinando, assim, a praticidade do senso comum com o método e o
rigor típicos da ciência e da filosofia.
DEBATE
Responda as questões abaixo.
1. Observe a charge na página seguinte comparando os quadros e analise os seus possíveis sentidos.
2. Quais as possíveis interpretações da Alegoria da Caverna?
3. Estabeleça relações entre o filme Matrix e a realidade social e política do Brasil atual.
4. Estabeleça relações entre a charge e a realidade social e política do Brasil atual.
5. Estabeleça relações entre a Alegoria da Caverna e a realidade social e política do Brasil atual.
Apresente as respostas à turma para debate.
Referências:
ARAGON, L. O camponês de Paris. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1996.
BLACKBURN, S. Dicionário Oxford de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994.
DROZ, G. Os mitos Platônicos. Brasília Editora Universidade de Brasília, 1997.
GRAMSCI, A. Concepção Dialética da História (trad. Carlos Nelson Coutinho). Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira. 1991.
HESÍODO, Teogonia: a origem dos deuses. São Paulo: Iluminuras, 2001.
PLATÃO; República. São Paulo: Abril Cultural, 1972.
REALE, G; ANTISERI, D. História da Filosofia. Vol. I. São Paulo: Paulus, 1991.
RICOEUR, P. Les Conflit des Interprétations: Essais D’Herméneutique, 1969 ( trad. port. O Conflito
das Interpretações: Ensaios de Hermenêutica).
SANTOS, B. de S. Um discurso sobre as ciências; São Paulo, Cortez, 2003.
VÁZQUEZ, A. S. Filosofia da Práxis (trad. Luiz Fernando Cardoso). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,1968.
VERNANT, J. P. Entre Mito e Política. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2001.
________, J. P. Mito e Pensamento entre os gregos. São Paulo: Editora Difusão Européia do Livro, Ed. da Universidade de São Paulo, 1973.
WEBER, M. Essays in Sociology. Oxford University Press , organizado por H.H
Gerth e C. W. M., 1946 ( trad. port. Ensaios de Sociologia).
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